STJ:Sexta Turma cassa decisão que considerou estupro como se fosse beijo roubado
  
Escrito por: Mauricio Miranda 18-10-2016 Visto: 574 vezes



Notícia extraída do site do Superior Tribunal de Justiça:



“DECISÃO



18/10/2016 7h59min



Sexta Turma cassa decisão que considerou estupro como se fosse beijo roubado



A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu recurso do Ministério Público de Mato Grosso e restabeleceu a sentença que condenou um jovem de 18 anos por estupro de uma adolescente de 15.



Após a sentença haver condenado o réu a oito anos em regime inicialmente fechado, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) o absolveu por entender que sua conduta não configurou estupro, mas meramente um “beijo roubado”.



Para o ministro relator do caso, Rogerio Schietti Cruz, a decisão do TJMT utilizou argumentação que reforça a cultura permissiva de invasão à liberdade sexual das mulheres. O relator lembrou que o estupro é um ato de violência, e não de sexo.



“O tribunal estadual emprega argumentação que reproduz o que se identifica como a cultura do estupro, ou seja, a aceitação como natural da violência sexual contra as mulheres, em odioso processo de objetificação do corpo feminino”, afirmou o ministro.



O magistrado criticou a decisão que absolveu o réu e o mandou “em paz para o lar”. Na opinião do ministro, tal afirmação desconsidera o sofrimento da vítima e isenta o agressor de qualquer culpa pelos seus atos.



Violência



Rogerio Schietti disse que a simples leitura da decisão do TJMT revela ter havido a prática intencional de ato libidinoso contra a vítima menor, e com violência.



Consta do processo que o acusado agarrou a vítima pelas costas, imobilizou-a, tapou sua boca e jogou-a no chão, tirou a blusa que ela usava e lhe deu um beijo, forçando a língua em sua boca, enquanto a mantinha no chão pressionando-a com o joelho sobre o abdômen. A sentença reconheceu que ele só não conseguiu manter relaçôes sexuais com a vítima porque alguém se aproximou naquele momento em uma motocicleta.



Mesmo com os fatos assim reconhecidos, afirmou o ministro, o tribunal de Mato Grosso concluiu que eles não se enquadravam na definição de estupro, prevista no artigo 213 do Código Penal: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.”



Para o desembargador relator do acórdão do TJMT, “o beijo foi rápido e roubado”, com “a duração de um relâmpago”, insuficiente para “propiciar ao agente a sensibilidade da conjunção carnal”, e por isso não teria caracterizado ato libidinoso. Afirmou ainda que, para ter havido contato com a língua da vítima, “seria necessária a sua aquiescência”.



Inaceitável



“Reproduzindo pensamento patriarcal e sexista, ainda muito presente em nossa sociedade, a corte de origem entendeu que o ato não passou de um beijo roubado, tendo em vista a combinação tempo do ato mais negativa da vítima em conceder o beijo”, comentou Schietti.



Segundo o ministro, a prevalência desse pensamento “ruboriza o Judiciário e não pode ser tolerada”.



Ele classificou a fundamentação do acórdão do TJMT como “mera retórica” para afastar a aplicação do artigo 213 do Código Penal, pois todos os elementos caracterizadores do delito de estupro estão presentes no caso: a satisfação da lascívia, devidamente demonstrada, aliada ao constrangimento violento sofrido pela vítima, revela a vontade do réu de ofender a dignidade sexual da vítima. Os demais ministros da Sexta Turma acompanharam o voto do relator.



O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.”




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